BREVE HISTÓRICO DA ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL NO BRASIL

BREVE HISTÓRICO DA ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL NO BRASIL


Alexandre Misturini
Silvana Zanin


O presente texto é um desafio e ao mesmo tempo um grande aprendizado para quem é ou estuda para se tronar orientador educacional no Brasil. Propomos um histórico sobre a orientação educacional no Brasil procurando relatar dados pertinentes ao estudo e compreensão da mesma.
A orientação educacional teve origem, por volta de 1930, a partir da orientação profissional que se fazia nos EUA. No Brasil, a orientação educacional mostrou-se válida na ordenação da sociedade brasileira em mudança na década de 1940 e incluía a ajuda ao adolescente em suas escolhas profissionais para o mercado de trabalho. A primeira menção a cargos de orientador nas escolas estaduais se deu pelo Decreto n. 17.698, de 1947, referente às Escolas Técnicas e Industriais. As Leis Orgânicas do Ensino referentes ao período de 1942 a 1946 fazem alusão à Orientação Educacional. Nesta época, não havia cursos especiais de orientação educacional, o que levou ao preenchimento dos cargos pelos chamados "técnicos de educação", muitas vezes selecionados por critérios duvidosos. Até 1958, São Paulo contava com cinco faculdades que ministravam o curso superior de orientação educacional, tendo sido, o primeiro deles, o curso criado pela PUC-Campinas, em 1945. Em 1958, o MEC regulamentou provisoriamente o exercício da função e o registro de Orientador Educacional, pela Portaria n. 105, de março de 1958, tendo ela permanecido provisória até 1961, quando a LDB 4.024 veio regulamentar a formação do Orientador Educacional.
A Lei 5.564, de 21/12/68, demonstra, assim como a LDB em vigor naquela época, preocupação com a formação integral do adolescente, embora traga orientações também referentes ao ensino primário, como era naquela época designado o ensino fundamental.
Art. 1º A Orientação Educacional se destina a assistir ao educando, individualmente ou em grupo, no âmbito das escolas e sistemas escolares de nível médio e primário, visando o desenvolvimento integral e harmonioso de sua personalidade, ordenando e integrando os elementos que exercem influência em sua formação e preparando-o para o exercício das opções básicas.
A LDB que veio a seguir, a 5.692/71, diz, no artigo 10: “será instituída obrigatoriamente a Orientação Educacional, incluindo aconselhamento vocacional em cooperação com os professores, a família e a comunidade". A LDB dá um sentido novo ao ensino de 1º e 2º graus: sondagem de aptidão e profissionalizante, por isso, a Orientação Educacional deveria se ocupar de aconselhamento vocacional. Para atender às exigências da legislação, o Decreto 72.846 de 1973 veio a regulamentar a Lei 5.564, de 1968, por meio de onze artigos, mantendo, porém, o artigo 1o da Lei 5.564, apenas substituindo as expressões "no âmbito das escolas e sistemas escolares de nível médio e primário" por "no âmbito do ensino de 1º e 2º graus." Uma leitura crítica da legislação e dos contextos sociais em que foram promulgadas pode nos levar a entender que a orientação educacional no Brasil tem cumprido os papéis que dela eram esperados; muitas vezes a favor do sistema excludente e poucas vezes carregada de ousadia no sentido da emancipação das camadas populares. Isso se deve, principalmente, ao fato de estar atrelada às políticas educacionais vigentes nos diferentes momentos históricos.
Os referenciais teóricos confusos e obscuros têm contribuído para a colocação da função do orientador no baú do esquecimento. Esteve ligada às relações de poder dentro da escola, às funções de comando, contribuindo para a divisão social do trabalho reproduzida dentro da escola.
Alguns autores alertaram para a necessidade de definição das funções e campos de atuação do orientador educacional. A maioria dos escritores afirmam que é importante uma construção de um elo entre a prática do orientador educacional e as variações da sociedade e cultura brasileiras, das ciências humanas e das teorias da educação.
Pode-se dizer que o campo de atuação do orientador educacional era, inicialmente, apenas e tão somente focalizar o atendimento ao aluno, aos seus "problemas", à sua família, aos seus "desajustes" escolares, etc., pouco ou quase nada voltado à autonomia do aluno e à sua contextualização como cidadão. Depois, voltou-se à prestação de serviços, mas sempre com o objetivo de ajustamento ou prevenção.
Na década de 1970, falou-se muito sobre a falta de compromisso da escola e de sua equipe pedagógica. Neste período existe uma tentativa de resgatar a importância da escolaridade para as estratégias de vida das camadas populares, chamando a atenção para a estrutura interna da escola como um dado significativo para o desempenho dos alunos. A Orientação estava dentro da escola e não se deu conta do seu papel. Neste período os orientadores educacionais deixaram o sistema andar sem dar a sua contribuição, isto é, sem fazer parte dele. Eles ficaram em cima do muro e calados. Perderam um espaço para demarcar o seu território na educação e a função social da profissão de OE. Por tais motivos, a Orientação Educacional começa a ser questionada a partir de 1980. Assim, os pressupostos teóricos começam a ser repensados e rediscutidos. O orientador começa a participar de todos os momentos da escola, discutindo questões curriculares, como objetivos, procedimentos, critérios de avaliação, metodologias de ensino, demonstrando sua preocupação com os alunos e o processo de aprendizagem. Os cursos de reciclagem que foram oferecidos aos orientadores contribuíram para que a discussão fosse mais ampla, envolvendo as práticas, os valores que a norteavam, a realidade dos alunos, assim como o mundo do trabalho.
A indisciplina, agressividade, desinteresse, dificuldades de aprendizagem (queixas mais comuns dos professores) não podem e não devem ser tratadas isoladamente e, sim, a partir de um estudo das relações "professor-aluno, aluno-conteúdo, aluno-aluno, aluno-estatutos escolares, aluno-comunidade, professor-comunidade. Origina-se aí uma nova visão de orientação educacional. A orientação, hoje, está mobilizada com outros fatores que não apenas e unicamente cuidar e ajudar os 'alunos com problemas'. Há, portanto, necessidade de nos inserirmos em uma nova abordagem de Orientação, voltada para a 'construção' de um cidadão que esteja mais comprometido com seu tempo e sua gente. Desloca-se, significativamente, o 'onde chegar', neste momento da Orientação Educacional, em termos do trabalho com os alunos. Pretende-se trabalhar com o aluno no desenvolvimento do seu processo de cidadania, trabalhando a subjetividade e a intersubjetividade, obtidas através do diálogo nas relações estabelecidas.
O trabalho do orientador educacional deve ser o de propiciar a aproximação entre a escola e a comunidade, desvelando os papéis e a influência que diversas instituições, tais como clubes, indústrias, comércios locais, associações, clubes, etc. exercem na comunidade. Preconiza a liberdade de extrapolar o espaço escolar indo rumo à comunidade escolar. A autora evidencia, desta forma, que o campo de atuação do orientador educacional não se limita à microestrutura escolar. O papel do orientador educacional como co-responsável pela aprendizagem dos alunos e muito importante. Questiona as práticas docentes envolvendo os aspectos didático-pedagógicos, tais como metodologia, avaliação, relação professor-aluno, objetivos, conteúdos, e mostra a necessidade de que os docentes conheçam e reflitam sobre o real significado da existência da escola e sua função social. Apresenta o papel do orientador educacional numa dimensão bastante ampla. Questiona a formação profissional, mostrando que há necessidade do domínio de conteúdos necessários a uma nova atuação.
Um processo social desencadeado dentro da escola, mobilizando todos os educadores que nela atuam - especialmente os professores - para que, na formação desse homem coletivo, auxiliem cada aluno a se construir, a identificar o processo de escolha por que passam, os fatores socioeconômico-político-ideológicos e éticos que o permeiam e os mecanismos por meio dos quais ele possa superar a alienação proveniente de nossa organização social, tornando-se, assim, um elemento consciente e atuante dentro da organização social, contribuindo para sua transformação.
Esse período referente à década de 1980, que chamamos de questionador, foi marcado por estudos, congressos, lutas sindicais, que, articuladamente, transformaram-se em grandes conquistas para os orientadores educacionais. A FENOE - Federação Nacional dos Orientadores Educacionais - teve importante papel em defesa dos orientadores educacionais, sendo extinta na década de 90, o que levou ao enfraquecimento da categoria profissional que representava. A AOERGS - Associação dos Orientadores Educacionais do Rio Grande do Sul - tem contribuído significativamente com a categoria profissional dos Orientadores Educacionais, sendo responsável pela publicação Prospectiva, que traz matéria sobre orientação no Brasil. O período orientador, a partir da década de 90, foi cheio de incertezas e questionamentos. Não se sabia se a nova LDB traria ou não menções ao Orientador Educacional em seu texto. Tais incertezas foram dizimadas com a publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96), que em seu artigo 64, diz:
A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional.
Embora pareça reconhecida a sua importância pela LDB, ao mesmo tempo deixa em aberto a formação profissional do orientador. Isso pode levar os cursos de Pedagogia a deixarem de formar o orientador educacional, relegando para a pós-graduação tal tarefa. Inicia-se um novo período nos anos 2000. O ensino, de uma maneira geral, e, em especial, o ensino público, está caminhando aos "trancos e barrancos". Globalmente, o país está mal no cenário educacional. É comum vermos reportagens mostrando o baixo nível de aprendizagem dos alunos nas escolas brasileiras. Isso mostra que a equipe escolar precisa ser rearticulada. No entanto, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Pedagogia, Licenciatura, em Parecer aprovado em 13/12/2005, reduzem a orientação educacional à área de serviços e apoio escolar, o que significa mais um passo para a extinção total desta função. Incoerentemente, o artigo 5o menciona que o egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto para uma série de tarefas possíveis apenas a partir de um trabalho integrado com outros profissionais da educação.
II compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a contribuir para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social;
VII promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a família e a comunidade;
XIV realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas experiências não-escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em diferentes meios ambiental-ecológicos; sobre propostas curriculares e sobre organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas.
É interessante observar que as tarefas apontadas são apenas algumas que podem ser realizadas pelo orientador educacional, em trabalho articulado com o gestor e o coordenador pedagógico. Não resta dúvida de que a gestão escolar que visa à emancipação necessita de apoio e trabalho conjunto de diferentes profissionais da educação, em suas diferentes frentes de atuação, que não podem ser relegadas a segundo plano. Toda escola realiza um trabalho pedagógico composto por situações de caráter burocrático-administrativo e situações de caráter pedagógico-administrativo. O primeiro grupo envolve, prioritariamente, a documentação escolar. Envolve, ainda, a organização e a divisão do trabalho propriamente dito: a divisão de funções, a determinação de horários a serem cumpridos pelos funcionários e horários de funcionamento dos diferentes setores; a divisão do pessoal nos diversos turnos e setores, abertura e fechamento de portões, merenda escolar, etc. Toda essa parte é importante porque, sem ela, a escola não pode caminhar. Ela representa a estrutura indispensável para que seja possível a realização do ato educativo. Não menos importantes são as situações de caráter pedagógico-administrativo. Envolvem todas as iniciativas que a escola deve ter para que o ensino e a aprendizagem ocorram. Aliás, este é o coração do trabalho pedagógico. Aí destacam-se duas ordens de necessidades diferentes: uma ligada ao professor e outra ligada ao aluno. Mesmo reconhecendo a imprescindibilidade da tecnologia da informação, o professor não pode ser descartado. Porém, para fazer frente a todos os avanços da sociedade, há necessidade de um novo professor, mais atuante, mais atualizado, com novas competências. Destaca-se, então, que a escola precisa ter um profissional que coordene todo o trabalho docente. E este é o profissional conhecido como "coordenador pedagógico". Este profissional é aquele encarregado de cuidar da atualização docente em serviço, de fornecer condições estruturais e materiais para que o trabalho docente se desenvolva, de divulgar obras existentes na biblioteca para os professores, organizar as reuniões pedagógicas, cuidar da interdisciplinaridade, enfim, proporcionar ao professor meios para que possa desenvolver o seu trabalho da melhor maneira possível. O aluno, por sua vez, é a razão de ser da escola. Para colaborar com o aluno e com as suas necessidades, a escola precisa contar com o trabalho do orientador educacional. Esse é o profissional que trabalha diretamente com o aluno e se preocupa com a sua formação pessoal. A ele cabe desenvolver propostas que elevem o nível cultural do aluno e tudo fazer para que o ambiente escolar seja o melhor possível.
O orientador educacional diferencia-se do coordenador pedagógico, do professor e do diretor. O diretor ou gestor administra a escola como um todo; o professor cuida da especificidade de sua área do conhecimento; o coordenador fornece condições para que o docente realize a sua função da maneira mais satisfatória possível; e o orientador educacional cuida da formação de seu aluno, para a escola e para a vida.
O Estado do Rio Grande do Sul não possui esse profissional em sua equipe de gestão. Por motivos administrativos, político econômicos, e até mesmo ideológico. Porém, nos dias atuais poucas escolas contam com o setor de Orientação Escolar para atender as necessidades da sociedade contemporânea frente ao mundo globalizado. Acreditamos que se faz necessário uma mudança estrutural nas políticas públicas de educação para o trabalho da Orientação Educacional seja mais reconhecido e tenha efetiva condição de sucesso em seu trabalho pedagógico.






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